O antigo bailarino do Ballet Gulbenkian (BG) Jair Moraes faleceu na manhã do dia de Natal no Hospital da Cruz Vermelha na cidade de Curitiba, Paraná, aos 65 anos. O artista estava hospitalizado havia cinco meses devido a uma infecção pulmonar grave. Tinha contraído o vírus H1N1 e lutava desde Agosto contra as consequências da doença. Em Outubro passado, 13 companhias e grupos de dança locais, com produção da Associação de Bailarinos e Apoiantes do Balé Teatro Guaíra, e a colaboração do Centro Cultural Teatro Guaíra, apresentaram “Todos com Jair Moraes”, em reconhecimento do seu trabalho de 50 anos em prol da dança e para angariar fundos para custear os tratamentos médicos. O espectáculo foi apresentado no Guairão, nome por que é conhecido o auditório Bento Munhoz da Rocha Neto, a sala principal do Teatro Guaíra.
Antes de adoecer Jair, para além de mestre-de-bailado da companhia do Guaíra também dirigia a Cia. Masculina de Dança, que derivou de um projecto social da Escola de Balé do Teatro Guaíra, iniciado 13 anos antes. Nele ensinou dança a meninos desfavorecidos e criou métodos para desenvolver a musculatura de rapazes que não tinham perfil físico para a dança clássica, ajudando, assim, a aumentar o número de homens na dança. para além de garantir que a maior parte dos seus alunos pudessem chegar à universidade. O grupo era pioneiro no Brasil por ser o primeiro formado apenas por homens.
“Ele trouxe brilho e vigor ao Balé Teatro Guaíra. O seu espírito inquieto mostrou novas vertentes para a dança e revelou muitos talentos que ganharam brilho próprio graças aos seus ensinamentos. Só nos resta aplaudir e reverenciar este mestre da dança”, disse a directora-presidente do Centro Cultural Teatro Guaíra, Monica Rischbieter. “Os funcionários do CCTG estão consternados com esta perda assim como as pessoas ligadas ao mundo das artes”, acrescentou.
Jair Moraes nasceu a 30 de Outubro de 1951 e era considerado uma figura cimeira da dança do Sul do Brasil. Começou a fazer aulas de dança aos 14 anos tendo posteriormente entrado, como estagiário, no Theatro Municipal do Rio de Janeiro, sob a direcção de Hector Zaraspe. Aí estudou com as duas professoras mais famosas da época: Tatiana Leskova e Eugénia Feodorova (1925-2007). Dançou seguidamente no Corpo de Baile do Teatro Guaíra, de 1970 a 1972, onde trabalhou com Yurek Shabelewski e, de seguida, foi solista do Corpo de Baile do Theatro Municipal de São Paulo entre 1972 e 1973, tendo, no final desse mesmo ano partido para a Europa, para integrar o elenco do BG, onde permaneceu oito temporadas. Dançou algumas obras do director da companhia, Milko Sparemblek mas, sobretudo, peças de Carlos Trincheiras (1937-1993), muitas das quais criadas para si (Ao Crespúsculo, Dimitriana, Enigmas e outras). Nos Estúdios Coreográficos da companhia coreografou algumas obras (Panambi, por exemplo) e dançou outras de colegas, como Círculo de Quatro Lados (António Laginha).
O Grande Circo Místico, com Vania Kesikowski – foto de Gus Hart
Regressado ao Brasil em 1979, como primeiro bailarino, tornou-se, posteriormente, mestre-de-bailado e assistente de ensaiador do Balé Teatro Guaíra. Após a morte de Trincheiras, assumiu a direcção do grupo entre 1994 a 1996. Então coreografou o bailado Canções (1994) e sob a sua direcção foram produzidas as obras Olhos para o mar (1996), de Henning Paar, Rhapsody in blue (1994), de Ana Mondini, O Mandarim Maravilhoso (1996), de Júlio Mota, Coppellius, o mago (1997), de Márcia Haydée, e Viva Rossini (1996), de Tíndaro Silvano.
Posteriormente dirigiu o grupo Raízes, em Caxias do Sul, de 1983 a 1990, e foi professor durante dois anos da Escola do Teatro Bolshoi, em Joinville.
Em 2009 foi homenageado no 27º Festival de Dança de Joinville por sua trajectória artística e no ano de 2014 a São Paulo Companhia de Dança, de parceria com o Governo do Estado de São Paulo, fez um documentário sobre sua vida, integrado na série Figuras da Dança.
Jair Moraes dançou, entre outras, com as bailarinas Ana Botafogo, Nora Esteves, Eliana Caminada, Maria José Branco, Eleonora Greca e Carla Couto, e recebeu vários prémios ao longo da sua carreira.
António Laginha