Sónia Baptista já fez espectáculos piores que “Vice-Royale. Vain-Royale. Vile-Royale” – apresentado em estreia na Culturgest, em 13 de Fevereiro – mas nunca um com um título tão disparatado e pretensioso. Notável é a sinopse da obra impressa no programa, um verdadeiro monumento de imaginação literária que, em vez de elucidar, apenas confunde e faz perder um “tempo malogrado” (citando a brochura).
Em ridículo e “non-sense”, a “geixa da lata de sardinhas” que deixou para trás, era bem mais atrevida que a desajeitada “pin-up” que agora canta a cappella em três línguas, mia e suspira dengosa.
Para não se sentir muito sozinha – e porque o palco da Culturgest parece ser demasiado amplo para tanto talento – trouxe um rapaz em roupa interior para ler uns textos com ar sério e distante, Rogério Nuno Costa.
De vez em quando até parece que a criadora – que assenta o seu “trabalho no território das artes performativas seguindo uma linha de criação alicerçada em pressupostos performativos e filosóficos” – se não leva muito a sério, o que ainda consegue ter um pouco de graça, mas as filmagens no Palácio de Queluz e o seu ar de “vamp” roubado a um velho filme de Ernst Lubitsch, não convencem ninguém dos seus dotes de “striper”, actriz, cantora e, muito menos, de bailarina. De pose em pose e de canção em canção vai Sónia enchendo o papo.
O aborrecido “show” alterna uns filmezinhos mudos a preto-e-branco e aparições em palco, sem que alguma vez o conteúdo se apresente verdadeiramente “surrealista” ou, por outro lado, com uma leitura linear digna de um espectáculo com um mínimo de espessura dramática e credível em organização coreográfica ou, em última análise, em substância artística.
A verdade é que Sónia pôs todo o cuidado na forma e no dispendioso detalhe, descurando o conteúdo. Mas mais irrelevante, para não dizer vilipendiado, ainda foi o movimento, surgindo, no final, a “bailarina” a improvisar sobre uma música com laivos jazzísticos, como uma coelha aos saltos, abanado as mamas (com uns peduricalhos nos mamilos) e os braços, dentro de uma espécie de “lingerie sexy”, antecipando a noite de S. Valentim.
Sónia Baptista, a quem a Direcção Geral das Artes, em 2001, promoveu não se sabe bem se a bailarina ou a “artista performativa” – através de um Prémio Revelação por uns desmazelados e inconsequentes apontamentos ao nível do exercício escolar de composição coreográfica – continua a ser bem “apoiada” pelo Estado nestes delírios que, no epílogo, até contaram com ofertas para os espectadores na saída: uns inúteis cartões desdobráveis com pano e gravuras de elevado custo.
Artifício que não convenceu alguns dos presentes que apuparam a estreia da peça e, perante o tédio instaurado, se manifestaram ruidosamente à saída da sala reclamando a quem de direito a responsabilidade de tal encomenda, a inclusão da mesma no calendário da “Dança” e, até, o valor pago pelos bilhetes.