Texto Publicado em MAIO 2007
Como é seu hábito chegou a Lisboa rodeada da maior discrição. Se não fora um comunicado para a imprensa vindo da Expo’98, nada faria prever que a coreógrafa germânica Pina Bausch – um dos maiores nomes da dança do nosso século – estaria na capital portuguesa.
Após o sucesso da sua "Sagração da Primavera" na vetusta Ópera de Paris e de uma curta temporada no Théâtre de la Ville, também na "cidade-luz", a famosa criadora começou logo a trabalhar em projectos futuros. Bausch, que pela primeira vez remontou uma peça sua noutra companhia (e logo numa instituição centenária e mundialmente conhecida pela excelência do seu reportório de raiz clássica), deslocou-se a Portugal acompanhada por três dezenas de bailarinos do seu Wuppertaler Tanztheater.
A diva alemã veio com a missão de conhecer melhor Lisboa. A sua passagem pela "cidade das sete colinas" (e de outros tantos pecados, que ela coreografou em Wuppertal em Junho de 76) durante o festival Lisboa’94, no qual apresentou algumas das suas melhores obras, não terá sido suficientemente marcante em termos de memórias e de vivências.
Tal como já fez com, pelo menos, três outras cidades (Madrid, Palermo e Hong Kong) a mãe da "dança-teatro", está começando a enredar-se nas teias de uma urbe cujas gentes, gestos e pensamentos lhe fornecerá o material necessário para uma peça a estrear em Maio de 98 no Festival dos Cem Dias.
Sabe-se que já se deslocou à praça de touros do Campo Pequeno onde assistiu, com alguns dos seus colaboradores, a uma tourada "à antiga Portuguesa". No mesmo dia em John Malkovitch andou a petiscar e a beber no Bairro Alto, Pina Bausch também percorreu as velhas ruelas daquela área acompanhada dos seus bailarinos em busca de uma outra noite lisboeta, desta vez menos "aristocrática"!
Em contacto com o sofrimento e a miséria humana, dois dos temas recorrentes do seu extenso reportório, a autora das "histórias teatrais dançadas" seguirá certamente um caminho diverso do de Wim Wenders que viu Lisboa através de Teresa Salgueiro, a melodiosa voz dos Madredeus.
Esperemos, pois, que a "cidade branca" inspire a coreógrafa numa obra que nos honre, com a qual nos identifiquemos e que faça jus à alma lusitana.
Melancólica sim, mas menos sombria e torturada do que a germânica que Bausch durante quase três décadas tem vindo a retratar nos palcos de todo o mundo.
António Laginha