Tem por título “Electra” – o nome de uma personagem trágica da mitologia grega – o último solo de Olga Roriz, inscrito nas históricas comemorações, que estão em curso, da implantação da República Portuguesa e estreado no Teatro Camões, no Parque da Nações, em Lisboa.
Apesar disso, tudo leva a crer que, dificilmente, fará história no reportório da coreógrafa-bailarina que já nos tem dado, com maior sucesso, obras de fundo de raiz histórica portuguesa (“Pedro e Inês”) e solos com mais intimidade e consistência e menos aparato (“As Lágrimas de Gulay Cabar”, por exemplo).
De um modo geral, a peça decorre num registo lento em que Olga, por vezes, mais parece uma espectadora da sua própria e variada escolha musical.
Uma hora e um quarto para um solo, com momentos algo mortos, encerra alguns escolhos em termos de dinâmica, apesar da bailarina ser uma artista carismática e muito experiente que se apresenta em boa forma física – diria, mesmo notável para a sua idade – desnudando o tronco repetidas vezes ao longo do espectáculo.
Um espaço imenso habitado por muitos adereços (designadamente uma cabeça gigante de rinoceronte que não tem qualquer aplicação prática ou interferência no conteúdo da obra), deixa Olga, por vezes, desamparada e entregue a múltiplas alternativas que acabam por ficar em aberto.
O material coreográfico em presença não deixa, porém, de se revelar interessante. A bailarina surge muito contida mas segura das suas repetidas movimentações de braços hirtos ou ondulantes, dos seus contactos prolongados com o solo e das suas manipulações dos longos cabelos soltos.
Um segmento coreográfico, em saltos altos, sobre talheres espalhados pelo chão debitando um som muito particular, traz um acrescido interesse visual e sonoro, ao contrário do momento final em que um excerto da ópera homónima de Richard Strauss, apenas serve para ilustrar a descida da cortina sobre a bailarina.
Não estando em causa a integridade artística de Roriz, mas sim a agenda com que se apresenta, a nossa República parece ter pouco, ou nada, a ver com o que a bailarina passa ao espectador, ainda que esse (eventual) “link” possa ser abordado de um ponto de vista metafórico.
Quanto à desdita de Electra que, segundo Olga Roriz "é uma mulher assustadoramente presente na sua ausência" que "nunca se expõe, apenas se dispõe", ela estará certamente muito mais presente na imaginação dos espectadores do que, verdadeiramente, no corpo da bailarina.