O primeiro programa (de câmara) da temporada da Companhia Nacional de Bailado (CNB) vem demonstrar o óbvio – a inabilidade do director artístico, Vasco Wellenkamp, para a tarefa a que o Ministério da Cultura o incumbiu.
Ao escolher um coreógrafo romeno seu conhecido, Edward Clug, que criou “Quatro Razões”, e Rui Horta, um coreógrafo português muito na moda e conhecido de todos – até do Presidente da República que o condecorou no passado 10 de Junho – debitou um programa escuro, desequilibrado e sem grandes atractivos.
Se a primeira peça é vestida a preto e encerrada numa cenografia com cortinas, painéis e piano em cena, na mesma cor, “Come Together”, de Horta, não tem qualuqer cenografia e apresenta figurinos, com um design muito semelhante ao anterior e que alinham pelos negros e cinzentos.
Cada uma das peças terá as suas intrínsecas qualidades mas, qualquer pessoa com um pouco de discernimento e noção de serviço público prestado por uma "companhia nacional", percebe, de imediato, que não funcionam juntas.
“Quatro Razões” para oito bailarinos
O trabalho de Clug, assente em movimentos despersonalizados, sincopados e curtos, divide-se em duas partes distintas.
Na primeira, quatro pares de bailarinos aparecem e desaparecem, habitando fugazmente – por vezes com uma certa surpresa – espaços criados por emissões luz espartilhada por balizas verticais e horizontais. Em algumas situações geram-se, mesmo, imagens confeccionadas com habilidade e encerrando um pouco de mistério.
Depois, com todos passam para a frente do pianista e de uma violinista, desenrolando-se uma segunda parte, em que termina o jogo do “tapa e destapa”, e os bailarinos vão rodando em cena…
“Quatro Razões” surge ferido de um certo tédio sonoro devido ao uso de uma música minimal e repetitiva, muito bem interpretada ao vivo pelo seu compositor, muito em moda nos longínquos anos 80.
No final, a obra, deixa um ligeiro sabor a exibição estéril de virtuosismo físico sem qualquer expressão anímica, em que a excessiva magreza de alguns artistas é acentuada pela negritude dos fatos e da própria paisagem cénica.
“Come Together”, right now ! Away of me
Uma dúzia dos 70 bailarinos da CNB protagonizaram “Come Together”, um trabalho “menor” de Rui Horta em que os artistas contribuem com muito do material coreográfico mas que carece do sagrado cimento do génio e da carpintaria teatral.
Horta é um “especialista” em combinar luz e multimédia com o “rapport” que os bailarinos sempre lhe trazem.
Neste trabalho parte de um elaborado projecto luminoso para fazer os artistas ocuparem, sucessivamente, corredores de luz que vão marcando o ritmo e percorrendo o proscénio. Depois descobre uma série de “ocorrências” que servem de pretexto para encher uma peça que, basicamente, se comporta como uma manta de retalhos.
Um discurso ao microfone que dura uns bons minutos e que cita Milan Kundera, revela-se uma perda de tempo dramatúrgico bem como umas tiradas (supostamente) humorísticas do bailarino Mário Franco que também toca em cena o seu precioso contrabaixo.
Com movimentos de inspiração aeróbica ou de natureza encarquilhada, “Come Together” balança-se entre a pose e o gracejo decorado com sucessivos "clichés" – o metrónomo a marcar o tempo é um dos mais batidos – e desnecessária informação verbal. Poder-se-á dizer, mesmo, que o muito palavreado contrasta com a falta de substância coreográfica.
Assim, e ao longo de uns bons minutos, o espaço cénico é sucessivamente preenchido com trechos de movimento que tanto primam pela irrelevância como pela diversidade num objecto híbrido e que ficou longe de ter agradado ao público do Teatro Camões que (na estreia) esteve longe de esgotar a sala da Expo.