“DESH” E OS SORTILÉGIOS DE AKRAM KHAN

“DESH” E OS SORTILÉGIOS DE AKRAM KHAN

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As últimas imagens de “Desh” – as mais persistentes e esteticamente mais cativantes – são as que ficam na memória e fizeram levantar o público do Grande Auditório do Centro Cultural de Belém, naqueles que foram os espectáculos do epílogo de uma extensa digressão que começou em 2011. Numa peça em que Akram Khan, o seu criador e intérprete, evoca, simbólica e não simbolicamente, o pai e as suas raízes no Bangladesh, muitas outras coisas vieram à superfície. Aliás, o artista que entretanto teve a alegria da paternidade afirma, mesmo, que a sua visão da obra e a maneira como pensava no seu progenitor têm vindo a mudar.

A viagem que AK partilha com o público é complexa e simples ao mesmo tempo. Complexa na abordagem, pouco literal, e, por vezes difícil de ler na entrelinhas. Simples no quer toca à informação falada que é lança para o palco.

Desh 278 by Richard Haughton

“Desh” – que significa “terra natal” em bengali – começa com o bailarino “inglês” a entrar de lanterna mão num imenso palco vazio que, pouco a pouco, se vai enchendo de sons, ideias, movimento e cenografia. “Candeia que vai à frente alumia duas vezes” parece ser o mote de toda a obra que transborda energia, sensibilidade, nostalgia e até humor. A obra é composta por vários quadros em que alguns adereços surgem a informar a narrativa e até projecções e animações muito bem elaboradas. Toda a concepção visual do espectáculo – da autoria de Tim Yip – é de grande qualidade e diversidade. Aliás Khan é conhecido por associar o seu nome e os seus trabalhos sempre a artistas de alto gabarito do mundo das artes.

Desh 117 by Richard Haughton

Em pouco mais de uma hora “Desh” faz viajar por um mundo de  sonhos e de episódios mais ou menos reais, em que um só intérprete enche o imenso palco do CCB. O final da obra, em que o bailarino se envolve numa imensa rede de panos que caem do tecto do palco é de uma beleza e impacto ímpares. Milhares de tiras movem-se e Khan aparece e desparece entre varas que sobem e descem, por vezes suspenso de cabeça para baixo.

No final o público, que quase encheu a sala na estreia, levantou-se em conjunto para aplaudir uma história com personagens ausentes que carrega algum exotismo e foi protagonizada por apenas um corpo. Um artista que se desmultiplica e se metamorfoseia com uma energia e inteligência perfeitamente contagiantes cheio de empatia e  sortilégios.

Desh 670 by Richard Haughton

fotos: Richard Hauton

Published by Antonio Laginha

Autoria e redação

António Laginha, editor e autor da maioria dos textos da RD, escreve como aprendeu antes do pretenso Acordo Ortográfico de 1990, o qual não foi ratificado por todos os países de língua portuguesa.

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