FALL, UM TROPEÇÃO NA FORÇA DE GRAVIDADE

FALL, UM TROPEÇÃO NA FORÇA DE GRAVIDADE

Fall-cJose-Caldeira_2-620x426

Parece ser deliberado que a peça ”Fall” (queda) tenha tantas leituras quanto é possível, ao tecer devaneios em cima daquela palavra inglesa que, em tradução portuguesa, tem tantas ou mais significâncias. Deve ser por isso que, querendo abranger tanto, se fica por tão pouco – ou quase nada – em matéria de conteúdo. Provavelmente Pina Bausch questionaria as razões que fazem mover artistas envolvidos em tanta queda e tropeção, que não parecem levá-los a lado nenhum, ao longo de mais de uma hora. Também seria interessante destrinçar uma única ideia na obra de Vitor Hugo Pontes saída das leituras que o coreógrafo alude ter feito de autores tão expressivos como Yes Klein e Bas Jan Ader, citados no programa.

O artista vimaranense propõe-se, expressamente, trabalhar quatro ideias fundamentais, com níveis de profundidade diferentes: “quedar-se de amores, a queda bíblica, no outono, a aproximação de um fim de ciclo na natureza e o movimento da queda física“, porém, apenas esta última poderá ser detectável ao longo do tempo que dura uma dança fisicamente muito exigente e visualmente bem orquestrada. Dir-se-ia, mesmo, que atinge uma certa dimensão poética dentro de um universo (cinético e musical) pouco dado a esse tipo de envolvimento. A nova criação de Pontes, estreada na sua terra natal e repetida no Porto, trouxe a Lisboa – ao Teatro Maria Matos no Dia Mundial da Dança de 2015 – mais um trabalho executado num rampa em plano inclinado. Deste coreógrafo é, pelo menos, o segundo… ou o terceiro. O que não deixa de ser mais do mesmo, sobretudo tendo em conta que a supra citada Bausch fez danças em cima de relva, água, flores, pedras e sabe-se lá que mais.

FALL 3 (2)

Desde logo parte-se de um exercício em que é visível alguma violência muscular com sete bailarinos pendurados pelos braços em varas, como roupa num estendal, caindo um após outro no solo. A recorrente força da gravidade é, pois, a grande protagonista de uma primeira e forte imagem que nunca mais é retomada nem explorada. E, depois de muito correr, tropeçar cair e levantar, empurrar, saltar e voltarem os corpos a procurar o solo, tudo termina numa pose serena cuja matriz é um rapaz a fazer o pino em cima da cabeça seguro por numa rapariga. Desde a roupa que envergam – vulgares peças de pronto-a-vestir – até ao próprio movimento, nada parece recorrer a alguma elaborada fantasia de carácter cénico. Tudo é pedestre, bastante musculado e protagonizado por sete jovens – Anaísa Lopes, Ângela Quintela, António Torres, Daniela Cruz, Diogo Almeida, Marco Ferreira e Valter Fernandes – bem ginasticados, destemidos e que entram em cena… para o que der e vier!

“Fall”, com música original de Rui Lima e Sérgio Martins – que pode ser interessante para uns e trivial para outros como, aliás, todo o movimento – desenvolve-se em frente de uma tela pintada com um céu azul e serenas nuvens sendo, cuidadosa e sensivelmente, iluminada por Wilma Moutinho.

FALL 3 (1)

Trata-se de um verdadeiro “tour de force” para os bailarinos que demonstraram uma enorme “endurance”, como nos bons velhos tempos do chamado “teatro físico”. Porém “Fall”, como atrás de mencionou, é muito débil em termos dramatúrgicos e a palavra teatro, no seu sentido mais tradicional, parece quase totalmente divorciada de tal obra.

Published by Antonio Laginha

Autoria e redação

António Laginha, editor e autor da maioria dos textos da RD, escreve como aprendeu antes do pretenso Acordo Ortográfico de 1990, o qual não foi ratificado por todos os países de língua portuguesa.

error: Content is protected !!