A reputada actriz são José Lapa, também conhecida pelo seu imenso e publicitado amor pela Dança, afirma (sempre que pode) que o Ministério da Cultura (MC) português não existe!
As razões recorrentemente invocadas é o alegado autismo daquele organismo e de todos os que tutela – designadamente a Direcção Geral das Artes (DGA), antigo Instituto Português das Artes e dos Espectáculos que também já se chamou de Instituto das Artes – perante os artistas que trabalham, mostram bons resultados e não recebem quaisquer apoios. Ao contrário de outros que pouco ou nada produzem e, durante anos a fio, têm subsídio garantido. E com ele parece que não vivem mal e custeiam os seus trabalhos – em alguns casos as palavras caprichos/desvairos artísticos aplicam-se com toda a exactidão – ainda que o público/contribuinte muito pouco ou nada receba em troca. Aliás, no caso da Dança… nem sabe quem eles são!
Basta consultar (online no site da DGA) as listas das candidaturas, as apreciações dos jurados que sustentam as verbas concedidas e, depois, ir verificar no terreno os resultados obtidos, para se aferir os belos “critérios” que se têm vindo a aplicar à Dança!
Legislação abundante, cheia de incongruências, não falta. Possivelmente para justificar – na maior das legalidades – que sejam sempre os mesmos a beneficiar já que só os membros do “clube” que receberam vários anos de seguida se podem candidatar a receber mais quatro de enfiada. Pena é que os júris, nomeados com critérios pouco claros e que classificam projectos artísticos com cruzinhas (ao jeito do Euromilhões), não sejam responsabilizados e obrigados, no ano subsequente, a avaliar o trabalho real dos que premeiam, dando a cara pelos bons ou maus resultados. Num estado democrático de direito, o contribuinte devia também ter acesso online a estas avaliações – já que tudo é, obrigatoriamente, informatizado nestes concursos chegando-se ao cúmulo da (implacável e justiceira) DGA já nem atender pessoalmente para ajudar em qualquer dúvida no preenchimento dos formulários (!) – mas tal não se verifica.
Será que isso não interessa a certos artistas e aos funcionários da DGA porque, assim, se vai perpetuando um sistema injusto e que afasta muitos devido ao suplício burocrático das candidaturas ou, simplesmente, porque se recusam pagar a empresas para obter documentação e preencher formulários que deveriam ser simples e acessíveis. Trabalho inglório que, em muitos caos, acaba na humilhação de ser desclassificado na secretaria! Já não basta ser bons artistas e fazer o seu trabalho com seriedade e consistência, é preciso também ter muito estômago, coragem e perseverança para lutar contra a arrogância e o cinismo, sobretudo se não se está dentro do fechado "clube das artes", que já foi dirigido por poetas, cantores, médicos, filósofos e outros que tais.
Em França, Nicholas Sarkozy, em nome de uma “cultura de excelência” resolveu tomar em mãos a dita e, segundo parece, prepara-se para fechar o ministério da cultura francês transformando-o numa mera secretaria de estado, esvaziada de poderes, apenas para dar guarida aos burocratas gestores de artes cujo vínculo com o Estado não é possível quebrar de uma penada!
Pelo que se conhece do Professor Cavaco Silva não se espera que venha, alguma vez, a tomar alguma decisão neste sentido – fazer uma política cultural de “estado” usando o eufemismo da “excelência” – mas é um bom aviso para quem tem vindo (com os seus poderzinhos discricionários) a apoiar incondicionalmente os chamados “subsídio-dependentes” que há anos têm o passaporte assegurado e, porque são “pós-modernos” e ostentam o selo das artes “performativas”, “multidisciplinares” ou “transdisciplinares”, podem dar-se ao luxo de fazer espectáculos para “amigos e conhecidos”… sempre "esgotados”! Veja-se a programação da “black box”, antigo armazém na cave do CCB (reservada aos bailarinos-coreógrafos portugueses, porque as companhias estrangeiras vão para o Grande Auditório) ou alguns espectáculos da Culturgest que sentam uma média de 50 espectadores por sessão.
Mas São José Lapa está errada. O MC existe, com as suas direcções gerais e muitas outras entidades dele dependentes (cerca de 25) e dá bons empregos a muita gente. Só o Conselho Nacional de Cultura, que aparece em primeiro lugar no seu organigrama, crê-se que não funciona. Vá-se lá saber porquê!
Mas é importante que todos tenham a consciência que ELES estão lá porque NÓS, ARTISTAS, EXISTIMOS.
Contudo, eles – presidentes, assessores, directores, programadores, curadores, produtores, gestores culturais, e outros que tais -, que desfrutam dos seus telemóveis topo de gama e recebem ajudas de custo (quantas vezes sem plafond) e outro tipo de benesses, possuem várias secretárias e “colaboradores” com fotocopiadoras da última geração e "lap tops" com Internet móvel e contas de e-mail à borla, para NOS INFORMAREM com ar pesaroso, que eles estão em reunião, numa acção de formação com o portátil inacessível, no estrangeiro em serviço ou em casa com um qualquer problema de “ordem pessoal” – parecem esquecer-se, recorrentemente, que NÓS EXISTIMOS.
Um qualquer bailarino-coreógrafo que faz fotocópias das mãos, rosto e traseiro, manipula folhas A4 e usa molas de roupa para pendurar a sua Arte em palco (que nem dinheiro precisa de gastar em roupa de cena) e recebe mais do que precisa para pagar à sua “entourage” – uma mão cheia de pessoas na para lhe dar apoio logístico e alisar o ego -, pode inventar toda a espécie de artifícios para engrossar as despesas e ainda lhe sobra dinheiro do subsídio da DGA para pagar a quem lhe preencha os formulários dos projectos de candidatura em computador e os grave em CD conforme se exige naquele organismo.
Por estas e por outras é bem possível que os senhores Burocratas das Artes já estejam a esticar demasiado uma corda… que um dia pode rebentar. Se olharem para a “cultura” de excelência em França talvez ganhem um pouco de juízo. É que os gestores de nomeação e os políticos portugueses, na sua fabulosa predisposição para o disparate, ainda vão inventar uma qualquer “cultura da bilheteira”… e, então, a avaliação, essa será impiedosa!