Uma das melhores surpresas do XXVIII Festival de Outono na Primavera de Madrid, foi, sem dúvida, a presença da cantora argentina Soledad Villamil, que se fez acompanhar por um grupo de cinco excelentes músicos e de um duo já famoso na Europa e nas Américas, os Irmãos Macana (Enrique e Guilherme De Fazzio).
Após receber em Espanha um prémio Goya por ter protagonizado “O Segredo dos Seus Olhos”, que ganhou o Óscar em Hollywood para o melhor filme estrangeiro em 2010, Villamil chegou ao aconchegante Teatro Español, no típico Bairro das Letras madrilenho, com créditos bem firmados como actriz. Faltava-lhe provar, na Europa que é uma grande cantora!
Com espectáculos de sucesso na sua nativa Argentina e dois discos gravados no seu curriculum, a cantora-actiz apresentou-se com um concerto exemplar em que viajou por um reportório alegre e ecléctico, escolhido com inteligência e visível bom gosto. Passeando-se com desenvoltura, humor e simpatia por milongas, tangos, chamarritas, rancheras, coplas e outros géneros musicais, com um sentido exacto de tempo teatral e uma postura despretensiosa. Villamil piscou o olho à plateia e, em simultâneo, fê-la interagir com o espectáculo, tudo com um misto de vivacidade e sentimento. E um pouco de nostalgia com o perfume de melodias de épocas passadas. As composições originais e as versões de velhos êxitos (um da chilena Violeta Parra, por exemplo) são atractivas e as suas personas em cada uma delas, surpreendentes e com muita raça, soltando a artista, em cada momento, a actiz que vibra em si.
Altos e esguios nos seus fatos negros e sapatos lustrosos, os esperados Macana deram um pouco de descanso a Soledad e ofereceram um curto show dançando, de seguida, três tangos no centro do palco. O seu estilo é humorístico (por vezes com caretas a mais) e picadinho, masculino mas rendilhado. Tecnicamente dançam com rigor e hábil sentido rítmico constituindo-se como uma dupla muito original, com forte presença e muito carisma.
Com alguns laivos de pura magia e um total entrosamento entre cantora e músicos, a noite terminou com o clássico “Adiós Pampa Mia” que deixou os argentinos presentes na sala com uma lágrima quase a despontar no canto do olho.
E assim se encerrou uma noite mágica na Primavera de Madrid com os fabulosos Irmãos Macana e a magnífica Soledad Villamil.
Revista da Dança: É a primeira vez que canta na Europa?
Soledad Villamil: Na verdade já estivemos em Barcelona, em Janeiro de 2010, apresentando o nosso segundo CD, "Morir de Amor".
RD – Acredita que os prémios de cinema que recebeu o ano passado lhe abriram as portas dos teatros de Europa?
SV – Creio que, sem dúvida, a repercussão do meu trabalho no cinema fez com que muitas mais pessoas se tivessem interessado também pela minha actividade musical.
RD – E também nos Estados Unidos da América?
SV – Sim, em Outubro próximo estaremos no Ringling Festival, em Sarasota, Florida.
RD – Para uma actriz de cinema é importante aproximar-se do público, num teatro, como cantora?
SV – Tanto no papel de actriz como no de cantora o meu lugar natural é a cena. Adoro fazer cinema e trabalhar para as câmaras mas, se não pudesse subir a um palco, sentiria que me faltava algo muito importante.
A magia de trabalhar directamente para o público numa sala é indispensável para mim.
RD – O concerto de Madrid está centrado apenas num determinado tipo de canções ou mostra deliberadamente todo o espectro do seu reportório?
SV – Os concertos serão um passeio pelos dois discos ("Soledad Villamil Canta" y "Morir de Amor") e também incluirão algumas canções que ainda não foram editadas. Sinto que o reportório se amplia cada vez mais incluindo não apenas tango e música popular argentina, mas também outros géneros musicais e algumas composições próprias.
RD – Porque achou importante convidar os Irmãos Macana?
SV – Essa foi uma proposta do festival que eu achei muito interessante. Primeiro porque são bailarinos extraordinários e, depois, porque imprime ao espectáculo uma dinâmica diferente. É um outro ponto de vista para ver o tango, essa expressão tão “portenha” mas que pode adquirir formas tão diversas.
RD – Para quem não tem oportunidade de a ver ao vivo no teatro como poderia resumir o seu concerto?
SV – É uma espécie de viagem, uma jornada por diferentes paisagens musicais da Argentina e da América do Sul.
Para mim cada tema revela-se uma espécie de conto, uma história de que desfruto interpretando e partilhando com o público.
António Laginha